O Desenvolvimento da Proposta Construtivista no Brasil
Frank V. Carvalho
Assim, no final dos anos oitenta e começo dos noventa (século XX) ser um professor ‘construtivista’ envolvia basicamente um aspecto teórico e outro ‘prático’ no qual havia ‘o que fazer’ e ‘o que não fazer’. No conjunto teórico se destacava: a) o estudo das fases da alfabetização; b) a teoria de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo e o ‘processo’ da aprendizagem; c) a compreensão de que cada aluno constrói o seu próprio conhecimento e que tem o seu caminho particular de aprendizagem; d) a compreensão de que os ‘erros’ são etapas construtivas durante o ‘processo’; e) a necessidade de se formar um leitor crítico; f) a compreensão de que o ‘processo’ deveria sempre caminhar do todo para as partes (caminhos sintéticos: globais ou ideovisuais) e finalmente, g) a ênfase na “aprendizagem significativa”.
Na atuação prática o professor deveria: a) agir como um mediador, não como um detentor do conhecimento; b) criar um ‘ambiente alfabetizador’ em sala de aula; c) valorizar o intercâmbio entre os alunos e o trabalho em grupo; d) avaliar os alunos de forma diagnóstica ao longo de todo o processo e conhecê-los ao ponto de fazer intervenções adequadas em cada caso; e) utilizar ‘textos’ ricos e complexos desde o começo do processo de alfabetização; f) tratar o aluno como se ele já soubesse ler e escrever, embora ainda não o soubesse.
E o professor construtivista não deveria: a) utilizar cartilhas ou “textos” específicos para ‘ensinar a ler e a escrever’; b) ir das partes (letras, sílabas ou palavras) para o todo (frases, texto, história); c) “enfatizar” a aprendizagem do alfabeto ou das sílabas mais do que o “texto”; d) realizar exercícios preparatórios de “prontidão” no começo da alfabetização; e) tratar o alfabeto unicamente como um código.
Esse “ideário” construtivista foi sendo moldado ao mesmo tempo pelas práticas docentes, pelas faculdades de formação de professores e pelas interpretações dos teóricos a partir das palestras e dos livros de Emília Ferreiro (ela veio ao Brasil diversas vezes para realizar palestras e seminários). Vale notar que, para os construtivistas, a “soma” dessas teorias e práticas jamais poderia ser chamada de “método” construtivista. Também deve ser destacado que, exceto nos cursos promovidos por uma ou outra entidade, nunca havia uma diretriz totalmente “clara” de atividades e procedimentos, mas apenas um corpo ‘teórico’ do qual o professor extraía e implementava suas próprias práticas.
Uma outra característica dessa fase, que mostra o ecletismo da proposta, foram as boas idéias de outras correntes pedagógicas que, agregadas ao modelo construtivista, deram um ar ainda mais modernizador e ‘inteligente’ à teoria. Dessa forma, práticas freinetianas[1], montessorianas[2], rogerianas[3] e ainda outras foram incorporadas pelos construtivistas. Embora nenhum dos teóricos do modelo reivindicasse isso, alguns educadores com menor conhecimento na área chegavam a julgar que o construtivismo detinha o ‘monopólio’ das boas idéias pedagógicas.
As práticas construtivistas ultrapassaram a alfabetização e foram sendo difundidas até a quarta série (quinto ano) do ensino fundamental. A partir da quinta série, dada a relativa escassez de pesquisas teóricas equivalentes no assunto, e a presença de um professor para cada disciplina, sua aplicação foi praticamente nula.
No Brasil havia um ambiente propício à aceitação do construtivismo. O fracasso escolar evidenciado no alto índice de reprovação da primeira série, a ansiedade dos professores em encontrar alternativas para esse problema, e o descaso das autoridades para com a evasão escolar, fizeram com que os docentes buscassem fazer uma transposição das situações de pesquisa construtivistas. Havia ainda o contexto político e social – com o fim dos anos da ditadura (1964-1984) havia um clima de mudança e uma rejeição do passado recente como se tudo o que estava em curso no país nos anos anteriores fosse fruto da ditadura. Muitos educadores lançaram-se à psicogenética como se ela fosse a solução para todos os problemas enfrentados em sala de aula. E não há como negar que muitos teóricos do ‘movimento’ incentivaram essa tentativa de transposição.
[1] Célestin Freinet.
[2] Maria de Montessori.
[3] Carl Rogers.
Frank V. Carvalho
Assim, no final dos anos oitenta e começo dos noventa (século XX) ser um professor ‘construtivista’ envolvia basicamente um aspecto teórico e outro ‘prático’ no qual havia ‘o que fazer’ e ‘o que não fazer’. No conjunto teórico se destacava: a) o estudo das fases da alfabetização; b) a teoria de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo e o ‘processo’ da aprendizagem; c) a compreensão de que cada aluno constrói o seu próprio conhecimento e que tem o seu caminho particular de aprendizagem; d) a compreensão de que os ‘erros’ são etapas construtivas durante o ‘processo’; e) a necessidade de se formar um leitor crítico; f) a compreensão de que o ‘processo’ deveria sempre caminhar do todo para as partes (caminhos sintéticos: globais ou ideovisuais) e finalmente, g) a ênfase na “aprendizagem significativa”.
Na atuação prática o professor deveria: a) agir como um mediador, não como um detentor do conhecimento; b) criar um ‘ambiente alfabetizador’ em sala de aula; c) valorizar o intercâmbio entre os alunos e o trabalho em grupo; d) avaliar os alunos de forma diagnóstica ao longo de todo o processo e conhecê-los ao ponto de fazer intervenções adequadas em cada caso; e) utilizar ‘textos’ ricos e complexos desde o começo do processo de alfabetização; f) tratar o aluno como se ele já soubesse ler e escrever, embora ainda não o soubesse.
E o professor construtivista não deveria: a) utilizar cartilhas ou “textos” específicos para ‘ensinar a ler e a escrever’; b) ir das partes (letras, sílabas ou palavras) para o todo (frases, texto, história); c) “enfatizar” a aprendizagem do alfabeto ou das sílabas mais do que o “texto”; d) realizar exercícios preparatórios de “prontidão” no começo da alfabetização; e) tratar o alfabeto unicamente como um código.
Esse “ideário” construtivista foi sendo moldado ao mesmo tempo pelas práticas docentes, pelas faculdades de formação de professores e pelas interpretações dos teóricos a partir das palestras e dos livros de Emília Ferreiro (ela veio ao Brasil diversas vezes para realizar palestras e seminários). Vale notar que, para os construtivistas, a “soma” dessas teorias e práticas jamais poderia ser chamada de “método” construtivista. Também deve ser destacado que, exceto nos cursos promovidos por uma ou outra entidade, nunca havia uma diretriz totalmente “clara” de atividades e procedimentos, mas apenas um corpo ‘teórico’ do qual o professor extraía e implementava suas próprias práticas.
Uma outra característica dessa fase, que mostra o ecletismo da proposta, foram as boas idéias de outras correntes pedagógicas que, agregadas ao modelo construtivista, deram um ar ainda mais modernizador e ‘inteligente’ à teoria. Dessa forma, práticas freinetianas[1], montessorianas[2], rogerianas[3] e ainda outras foram incorporadas pelos construtivistas. Embora nenhum dos teóricos do modelo reivindicasse isso, alguns educadores com menor conhecimento na área chegavam a julgar que o construtivismo detinha o ‘monopólio’ das boas idéias pedagógicas.
As práticas construtivistas ultrapassaram a alfabetização e foram sendo difundidas até a quarta série (quinto ano) do ensino fundamental. A partir da quinta série, dada a relativa escassez de pesquisas teóricas equivalentes no assunto, e a presença de um professor para cada disciplina, sua aplicação foi praticamente nula.
No Brasil havia um ambiente propício à aceitação do construtivismo. O fracasso escolar evidenciado no alto índice de reprovação da primeira série, a ansiedade dos professores em encontrar alternativas para esse problema, e o descaso das autoridades para com a evasão escolar, fizeram com que os docentes buscassem fazer uma transposição das situações de pesquisa construtivistas. Havia ainda o contexto político e social – com o fim dos anos da ditadura (1964-1984) havia um clima de mudança e uma rejeição do passado recente como se tudo o que estava em curso no país nos anos anteriores fosse fruto da ditadura. Muitos educadores lançaram-se à psicogenética como se ela fosse a solução para todos os problemas enfrentados em sala de aula. E não há como negar que muitos teóricos do ‘movimento’ incentivaram essa tentativa de transposição.
[1] Célestin Freinet.
[2] Maria de Montessori.
[3] Carl Rogers.
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