CAPÍTULO
XV
BRASIL
- SUDESTE
"Só tem o
prazer da volta quem um dia partiu".
O dia amanheceu e já estávamos no
Espírito Santo. Entramos numa região cuja individualidade encerra o centro
econômico do país. Mas esta supremacia, que se apoia num aproveitamento mais
intensivo do espaço e dos recursos humanos e minerais, teve a sua construção
com o esforço de brasileiros de todas as partes. Contornamos Vitória por fora e
rapidamente já estávamos chegando no Rio de Janeiro.
Antes de sair deste estado,
resolvemos tomar uma foto de uma montanha muito bonita. Batemos a foto daquelas
rochas com formas diferentes e interessantes. Mais tarde, comparando a foto com
postais antigos, vimos que se tratado do "Frade e a Freira".
Na divisa com o Rio paramos. O carro
fazia um barulho estranho na suspensão e o Márcio queria dar uma olhada.
- Tem um rachamento na longarina!
Disse ele.
- E isto é sério? Perguntei.
- Muito não! Pode acontecer de a
gente passar num buraco e ficar na estrada! Disse ele brincando e continuou:
- Devemos avançar mais devagar para
garantirmos a chegada!
Devagarinho seguindo pela estrada
vimos ao lado da pista um grupo dos sem-terra. Paramos um pouco para conversar
com o líder deles. É a velha história: gente pobre e trabalhadora que quer
apenas um pedaço de terra para plantar e viver com a família.
Saímos dali e fomos até Campos, onde
almoçamos. Passamos em Niterói e demos uma paradinha no Rio. Como estávamos
fazendo nos outros lugares, decidimos apresentar no penúltimo dia nosso projeto
para a maior emissora de TV do país. Mas daria muito trabalho atender três
jovens aventureiros num final de semana, segundo a chefe da equipe de
reportagem que nos atendeu. E afinal de contas ela também é "filha de
Deus" e merece descansar, conforme ela mesmo disse.
Saímos do Rio as dez da noite e
estranhamente achamos o mapa embaixo do banco do motorista. Quem colocou ali?
Sei lá. Provavelmente quem deu a bronca.
Lá pela uma da madrugada, a bateria
foi pro brejo e apagou na via na Dutra. Quando levantamos a tampa do motor
vimos que o eixo do alternador tinha travado. A bateria não recebia mais carga
e não nos era possível continuar. Única solução: tentar consertar o problema no
alternador. Morrendo de sono desmontamos a peça e descobrimos que o rolamento
tinha quebrado e as esferas saíram fora. Só um novo rolamento ou um jeitinho de
"Macgiver". Como naquela hora não conseguiríamos um novo rolamento,
fomos até um caminhão que estava estacionado próximo e tiramos com o dedo um
monte de graxa emprestada. Lambusamos de graxa o que sobrou do rolamento e
fizemos o teste. Funcionou! Saímos com faróis apagados para não forçar a
bateria e iniciamos a contagem regressiva.
Neste trecho final falávamos sobre o
resultado final da nossa viagem. Agora, já chegando, vimos que nossos alvos
foram alcançados. Ao darmos a volta pelos oito principais países da América do
Sul e atravessarmos dezessete estados do Brasil vimos que o nosso primeiro alvo
foi alcançado.
O nosso recado ecológico foi dado. É
claro que em virtude da nossa passagem rápida pelos lugares a nossa campanha
foi limitada, mas por outro lado não há como medir seus resultados.
Entrar para o Guinness foi uma ideia
que surgiu após o plano inicial da viagem. E passou a ser um dos nossos
principais alvos. No entanto, se entraríamos ou não para o Livro dos Recordes, dependeria da análise
que os responsáveis pela verificação dos recordes fariam.
Entramos na marginal e começamos a
sentir o prazer de chegar em casa de novo. No carro conversávamos dizendo que
não haveria ninguém para a ansiada recepção. Pegamos a estrada de Itapecerica e
chegamos no ponto exato da nossa partida. Fizemos uma prece agradecendo a Deus
a proteção durante toda a viagem. Estávamos sós. Olhei o hodômetro do carro e
peguei papel e lápis. O Márcio usou a calculadora. Foram 28.709 quilômetros em
47 dias de viagem pelo terceiro mundo. Chegamos!
Nos abraçamos e parabenizamos como
se os três tivessem ganho a medalha de ouro. E de fato ganhamos. Não a
olímpica, mas a de quem consegue, quem luta, quem persevera até o fim, quem
alcança a vitória. Não havia ninguém nos esperando. De repente chegou a família
do Binho. Naquela hora, a nossa chegada, me fez lembrar uma frase do atleta
Zequinha Barbosa que li certa vez no jornal: "Não corro para a imprensa ou
para a TV, corro para mim e para meus familiares. São eles os que vão fazer
festa para mim se eu chegar em 5º, 6º ou 10º lugar".
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