quinta-feira, 31 de julho de 2014

A PEDAGOGIA DE PROJETOS

A PEDAGOGIA DE PROJETOS

Dr. Frank Viana Carvalho
Ms. Delly Danitza Lozano Carvalho
Resumo
Hoje se fala muito da importância de se trabalhar com projetos para a eficiência e eficácia da educação. Será que realmente os projetos são a resposta que a escola esperava? Se sim, o projeto acaba por ser um planejamento de ações pedagógicas que pode surgir como fruto da vontade do grupo e não apenas da vontade do diretor escolar ou do professor regente.

Abstract
Today there is much talking of the importance of working on projects for the efficiency and effectiveness of education. Does it really projects are the answer that the school expected? If yes, the project turns out to be planning a pedagogical actions that may arise as a result of the will of the group and not just the will of a school principal or classroom teacher.


Há alguns anos estivemos em um Congresso de Educação em Brasília e assistimos junto com outros congressistas uma peça teatral sobre a escola. A peça pareceu-nos muito interessante e a personagem central da narrativa era a "escola". Vivendo muitas angústias, crises e depressões e sem conseguir resolver seus principais problemas, a "escola" conhece então uma personagem que finalmente a ajudará: o "projeto pedagógico". A peça seguiu até ao seu final na apresentação das incríveis "soluções" que o "projeto" oferecia à "escola".

Infelizmente em se tratando de educação não existem soluções mágicas como naquela encenação. Todas as soluções efetivas passam por muito planejamento, muito trabalho e até ajustes e reajustes. Isto também acontece com o atualmente "famoso" Projeto Pedagógico. Hoje se fala muito da importância de se trabalhar com projetos para a eficiência e eficácia da educação. Será que realmente os projetos são a resposta que a escola esperava? Será que uma pedagogia de projetos apresenta as melhores soluções para as questões da educação? Procuramos resumir aqui algumas contribuições para elucidar esta "novidade" educacional.

Em se tratando de educação, o que é um Projeto?

A característica básica de um projeto é a de ter um objetivo compartilhado por todos os envolvidos, que se expressa num produto final em função do qual todos trabalham e que terá, necessariamente, destinação, divulgação e circulação social internamente na escola ou fora dela. Além disso, os projetos permitem dispor do tempo de forma flexível, pois o tempo tem o tamanho necessário para conquistar o objetivo: pode ser de alguns dias ou de alguns meses.

Para sua execução, portanto, é preciso planejar, prever, dividir responsabilidades, aprender conhecimentos específicos relativos ao tema em questão, desenvolver capacidades e procedimentos específicos, usar recursos tecnológicos, aprender a trabalhar em grupo agindo de acordo com as normas, valores e atitudes esperadas, controlar o tempo, dividir e redimensionar as tarefas, avaliar os resultados em função do plano inicial.

Vários tipos de projetos
Em se tratando de educação existem vários tipos de projetos e relacionamos aqui os principais:
1. O Projeto Pedagógico, que também é chamado de Proposta Pedagógica, é amparado na LDB e é uma exigência legal para as Instituições Educacionais. Este Projeto é um retrato da Instituição, pois ali estará um detalhamento das ações que serão desenvolvidas, os recursos que serão aplicados, a estrutura oferecida pela Instituição, a sua metodologia de ensino, o seu sistema disciplinar, o seu modelo de avaliação, bem como os projetos pedagógicos que serão desenvolvidos no período letivo.
2. Os Projetos Globais, também são chamados “Projetos Macro”. Sua característica principal é a interdisciplinaridade, mas sua ênfase não são os conteúdos curriculares (embora trabalhe com estes), e sim os conteúdos atitudinais e valorativos. Seu enfoque está no desenvolvimento das habilidades e dos valores. São exemplos de Projetos Globais as Feiras Culturais, as Feiras de Ciência, os grandes eventos esportivos escolares (Jogos Abertos, Olimpíadas, etc.) as Exposições Escolares, as Gincanas, as Semanas Especiais e outros eventos que em sua execução acabam por envolver toda a escola ou várias séries e turmas (ou até mesmo mais de uma escola).
3. Um outro foco importante são os Projetos de Sala de Aula. Eles se subdividem em Projetos Disciplinares (Disciplinas Específicas), Projetos Multidisciplinares (um tópico que é abordado por diferentes disciplinas, sob diferentes aspectos) e Projetos Interdisciplinares (temas ou tópicos que fazem parte de mais de uma disciplina necessariamente).
4. Projetos com Jogos - Aproveitando o potencial dos jogos no desenvolvimento dos alunos, estes Projetos  utilizam os jogos no contexto das disciplinas, trabalhando os seus conteúdos de forma direta ou indireta, potencializando as ações pedagógicas no desenvolvimento de atividades cognitivas, sociais, afetivas, lúdicas,  recreativas e motoras.
5. Projetos com Temas Geradores - Para a atuação com conteúdos Didáticos e curriculares em forma de Projetos, sobretudo em sala de aula e com uma turma especificamente. Envolve uma participação efetiva dos alunos na busca do conhecimento e das respostas e soluções aos problemas propostos. Eles podem ocorrer em sala de aulas, no ambiente escolar ou mesmo em forma de pesquisa extraclasse.

O projeto que se apresenta como uma proposta de solução para o professor no seu dia a dia é o último da lista anterior: o projeto com Temas Geradores. Isto até em função de que os outros projetos continuarão acontecendo na escola - provocando ou não mudanças, trazendo ou não soluções. Desta forma existe uma necessidade de que o professor transporte para dentro de sua sala de aulas a construção e a realização dos projetos a fim de que eles sejam ferramentas pedagógicas reais. Vejamos o porquê.

Dilema da escola : Tempo & Conhecimento & Competências.
A vida real apresenta ao ser humano a necessidade conjunta de conhecimento e de competências. No caso aqui, queremos definir "conhecimento" como o conjunto dos conhecimentos teóricos ou curriculares. Por outro lado, as competências serão definidas como as habilidades necessárias para a utilização deste conhecimento. Perrenoud as define como a “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”[1].

A escola moderna vive um grande dilema: possui uma significativa bagagem (carga) de conhecimentos curriculares (teóricos) muito grande que julga serem necessários para os seus alunos. De igual modo, também crê na importância do desenvolvimento das habilidades ou competências. Para Fernando Hernandez, o principal autor e referência no assunto, “projeto é o enfoque integrador da construção de conhecimento que transgride o formato da educação tradicional de transmissão de saberes compartimentados e selecionados pelo professor.” Para ele, "todas as coisas podem ser ensinadas por meio de projetos, basta que se tenha uma dúvida inicial e que se comece a pesquisar e buscar evidências sobre o assunto”. [2] 

Alguns professores optam por dar bastante conteúdo (entenda aqui conteúdo como conhecimentos teóricos) em detrimento do enfoque nas habilidades (conteúdos atitudinais) e nos valores (conteúdo valorativo). Na realidade, existem cobranças pelo avanço no conteúdo teórico (dar toda a matéria) e ao mesmo tempo se avolumam as pressões para que os docentes também trabalhem com o desenvolvimento das habilidades. Mas isto exige tempo e preparo. Na prática a maioria enfoca o primeiro em detrimento do segundo e uma outra parte dos professores enfoca as habilidades em detrimento do avanço nos conteúdos. Será que existe solução para este dilema?
Pensando neste problema alguns educadores têm elaborado propostas interessantes e que têm funcionado com sucesso em diferentes escolas. Um delas é a pedagogia de Projetos, com eles acontecendo dentro da sala de aulas (conhecida como Temas Geradores).

Descrevendo o Projeto com Temas Geradores
Os Projetos com temas geradores são de grande valor para a prática pedagógica cotidiana, pois eles permitem que se realizem no dia a dia da sala de aula, projetos multidisciplinares com temas curriculares.
Diversos professores gostariam de trabalhar de forma diferenciada todos os dias a fim de motivar os seus alunos e isto de fato é possível. Como afirmou recentemente o educador espanhol Antoni Zabala: “o segredo de tudo está na participação dos alunos no processo”[3]. Desta forma, a proposta dos projetos com os temas geradores vê na participação dos alunos o diferencial para o sucesso da relação ensino e aprendizagem.

I - A Escolha dos Temas
Com base na proposta que o professor pretende trabalhar com os seus alunos (proposto em seu planejamento) e com base nos objetivos propostos, o professor deve lançar propostas de temas de acordo com a realidade dos alunos.
Pensando nas habilidades que almeja desenvolver, o professor deve indicar uma linha principal ou um tema gerador. As habilidades que ele pretende trabalhar com seues alunos podem ser cognitivas, de relacionamento interpessoal, sensório-motoras, visuais-espaciais, sócio-afetivas, morais, etc.

II - A Construção do Projeto
Esta construção ocorre conjuntamente com os alunos, mas para o seu início o professor utiliza-se de um recurso pedagógico chamado de “agente estimulador”. Este agente pode ser um filme sobre o assunto, uma excursão, uma reportagem, uma notícia importante e atual, uma propaganda, uma entrevista, etc.
Este agente estimulador vai criar o clima e o espaço adequado para que o professor conduza um “debate” ou “discussão” sobre o assunto. Neste momento haverá um aprofundamento sobre o conhecimento relativo ao tema principal (gerador). Ocorrerá um PQA[4] ou um processo que permitirá levantar os pontos que precisam ser aprofundados.

PQA (Pensar, querer, aprender)

A estratégia do PQA (KWL[5]) foi desenvolvida por Donna Ogle[6] e é um poderoso meio para ajudar os alunos desenvolverem e construírem significado. Antes de começar uma atividade de representação, leitura de um capítulo, assistir a um filme ou desenvolver um projeto, os alunos devem escrever (ou dizer) “o que eu penso sobre este tópico?” (P). e “o que eu gostaria de (ou quero) aprender sobre este assunto?”(Q)? Depois da leitura, apresentação, observação, etc, os alunos devem relatar “o que eu aprendi” (A).

PQA

O que eu sei
O que eu gostaria de saber
O que eu aprendi

A partir do “agente estimulador” várias abordagens podem ser feitas pelo professor:
Fazer perguntas aos alunos:
a) O que vocês gostariam de aprender sobre ...?
b) O que podemos fazer para realizar uma pesquisa sobre ...?
c) O que temos ouvido falar sobre ...?

Ele deve também incentivar e estimular os alunos para questões que eles possam estar fazendo para um aprofundamento no assunto em questão. O professor, de maneira cuidadosa, vai estabelecendo os caminhos da pesquisa a partir das questões levantadas.

Coordenar os objetivos gerias do planejamento com os objetivos estabelecidos no Projeto com os Temas Geradores.

Algumas questões e perguntas colocadas pelos alunos serão repetitivas, superficiais e até mesmo, redundantes. Cabe ao docente, respeitando a opinião dos alunos, resumir, direcionar, suprimir e esquematizar em linhas gerais o Projeto.
Esta característica de partilha do planejamento, inerente ao desenvolvimento do projeto, favorece o necessário compromisso do sujeito que aprende com sua própria aprendizagem, pois ela se torna muito mais produtiva quando o grupo que realiza o projeto conta com a participação de cada um na função de alcançar uma meta comum, do que quando as tarefas são definidas apenas pelo professor.

III - Os Objetivos e a Duração
Os objetivos do tema proposto serão aqueles que estão estabelecidos no planejamento que o professor faz ao começo do ano. Alguns objetivos específicos serão aprofundados em função do tema.

O Projeto pode durar um mês, um bimestre ou mesmo mais, podendo ser até mesmo todo o ano letivo. Como funcionará em concordância com os objetivos e o programa estabelecidos no planejamento, não haverá nenhuma fragmentação de conteúdos, superficialidade ou desgaste na exploração do tema por excessiva exposição. No entanto, ao planejar o Projeto, o professor deverá ter em mente o início (abertura), o durante (desenvolvimento) e o fechamento (conclusão) desta atividade.

IV - Durante o Projeto
Os alunos estarão desenvolvendo uma pesquisa e montando uma “pasta” com todas as informações coletadas. Esta pasta, também chamada de “Dossiê” consiste em tudo o que o aluno pode conseguir sobre o assunto proposto. A Realização do Projeto não exige que haja um formato específico para este Dossiê, a menos que o professor estabeleça desta forma.

V - Compartilhando
Em um tempo devidamente separado para esta finalidade, o professor abre um espaço na sala de aula para que os alunos compartilhem as novas informações que eles estão conseguindo sobre o assunto. Isto pode estar ocorrendo cada dia, ou semanalmente ou ainda em outra periodicidade estabelecida pelo professor.
Este será um momento importante, pois os alunos estarão contanto sobre o que eles aprenderam ao realizar aquela pesquisa. Desta forma, novos conhecimentos e experiências serão compartilhadas.

VI - Fechamento
A parte final é a entrega do “Dossiê”. Neste dia os alunos, juntamente com o professor estarão apresentando as conclusões mais importantes sobre aquela grande pesquisa e “jornada de exploração” do tema proposto.
Os “Dossiês”, após a revisão do professor, voltam para os alunos, formando assim parte de um arquivo pessoal. Se este material foi colocado em uma pasta com folhas plásticas, ou encadernado em espiral, certamente poderá levar o aluno o aluno a sentir uma motivação maior para guarda-lo e consulta-lo futuramente, até mesmo como fonte de pesquisa.

Resumindo o Projeto com Temas Geradores

Preparativos:
1. Objetivos do Educador.
2. Comunicação entre o professor e a coordenação e direção da escola.

Escolha do Tema:
a. Escolha feita juntamente com os alunos.
b. Várias propostas apresentadas pelo professor, os alunos escolhem uma.
c. A proposta é então definida pelo Professor
d. Elencar as possíveis dificuldades (resistência dos pais, dos alunos, dificuldades com o tema proposto) e mostrar as possibilidades de superação destes obstáculos.

Desenvolvimento do projeto:
1. Lançamento do Projeto.
2. Escolha dos itens a serem estudados e trabalhados.
3. Escolha do nome oficial do projeto.
4. Atividades propostas para o trabalho no projeto.
5. Definição do tempo de trabalho.
6. Análise das fontes de pesquisa.
7. Adequação às necessidades da classe e aos objetivos do professor para com seus alunos
8. Pesquisa das informações necessárias.
9. Levantamento de dados
10. Elaboração do mural do projeto
11. Ambiente da sala – respira o projeto
12. Elaboração do Dossiê do aluno.

Fechamento do Projeto:
1. Dossiê do aluno.
2. Álbum de informações da classe.
3. Depoimento dos pais.
4. Avaliação com os alunos sobre o desenvolvimento do Projeto.


Conclusões Finais

O projeto não é a "salvação" da escola como naquela peça teatral que citamos a princípio, mas não se pode negar que ele traz várias respostas para os principais problemas que a escola enfrenta. E para o trabalho com os conteúdos e com o desenvolvimento de competências o desenvolvimento de projetos em sala de aula parace ser uma solução apropriada.

Em educação não existe mudanças repentinas ou o “ovo de Colombo”. Se quisermos resultados, teremos que planejar e trabalhar. Qualquer que seja o caminho para melhores resultados, ele, sem dúvida, passa por muito esforço e dedicação. Assim também o é com a proposta da construção de projetos para que eles direcionem o trabalho da escola, dos professores e dos alunos. Em última instância o Projeto acaba por ser um "planejamento" de ações pedagógicas que pode surgir como fruto da vontade do grupo e não apenas da vontade de um diretor ou professor. Aceite o desafio: construa um projeto com seus alunos e execute-o. Você perceberá que é mais fácil do que parece.

Referências
[1] PERRENOUD, Phillipe. Dez Novas Competências para ensinar. Porto Alegre: ARTMED, 2000, p. 27.
[2] HERNÁNDEZ, Fernando.; VENTURA, Montserrat. A organização do currículo por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. 5ed., Porto Alegre: Artmed, 1998.
[3] ZABALA, Antoni. Modelos se discutem (artigo). Revista do Ensino Superior. São Paulo: Editora Segmento. Ano 2, nº 26, novembro de 2000, pp. 12-15.
[4] PQA: O que Penso sobre o assunto; o que Quero aprender; o que finalmente Aprendi.
[5] KWL – Knowledge, Want to learn, Learning.
[6] OGLE, Donna. KWL: A teaching Model that Develops Active Reading in Expositoy Text, The Reading Teacher 39, 1986, 564-576.

sábado, 19 de julho de 2014

Homenagem a um Amigo que se foi - Rubem Alves

Nós nos conhecemos com ele já maduro, experimentado e sábio. Minha insistência em levá-lo para palestrar em alguns lugares era mais pelo desejo de conversar com ele, de ouvi-lo e trocar algumas ideias, do que pelas palestras em si (o que era um espetáculo à parte). Falamos sobre muitas coisas: Deus, fé, religião e sofrimento ocuparam mais espaço a princípio... depois educação e política. Filosofia e Psicanálise quase ficaram de fora... Generoso, ele aceitou o convite tímido que fiz para ler meus escritos e até dividirmos alguma publicação futura... Nesse último, não deu tempo...
Ele primeiro foi pastor e depois seguiu o rumo da educação. Estudou bastante, ajudou muitas pessoas e viveu intensamente. Talvez em função das trajetórias semelhantes em alguns aspectos, eu o admirasse tanto...
Agora ele se foi - uma das mentes mais lúcidas em conseguir captar o essencial da vida... 
Vá ao encontro do Criador, meu amigo. Um dia a gente se encontra.
"Já tive medo de morrer. Não tenho mais. Tenho tristeza. A vida é muito boa. Mas a Morte é minha companheira. Sempre conversamos e aprendo com ela. Quem não se torna sábio ouvindo o que a Morte tem a dizer está condenado a ser tolo a vida inteira." Rubem Alves

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