quinta-feira, 27 de setembro de 2012

QUESTIONANDO A EXISTÊNCIA DOS (JARDINS) ZOOLÓGICOS

QUESTIONANDO A EXISTÊNCIA DOS
(JARDINS) ZOOLÓGICOS

Dr. Frank Viana Carvalho

Resumo
Em todo o século XX, vários pesquisadores se posicionaram pelo fim dos jardins zoológicos, marcando posição a favor da criação e aumento das reservas e áreas de proteção (ambiental) da vida animal nos países originários dessas espécies. Nestes locais seriam mantidas as pesquisas sobre os animais, com aparatos, equipamentos e cuidados para que houvesse o mínimo possível de invasão dos espaços da vida animal. Faz sentido ainda existirem Zoológicos?

Abstract
Throughout the twentieth century, several researchers have positioned the end of zoos scoring position in favor of creating and increasing reserves and protected areas (environmental) of animal life in the originating countries of these species. These sites would be maintained research on animals, with apparatus, equipment and care so that there was the least possible invasion of areas of animal life. Zoos makes sense still exist?

Já há alguns anos venho questionando a existência dos Zoológicos, não como um ambientalista, mas como filósofo. Quanto mais estudo e leio sobre o assunto, tanto mais me convenço da sua inadequação, anacronismo e irracionalidade.

Ora, é necessário questionar não só o ‘para quê’, mas também o ‘porquê’ de, em nossas cidades, termos zoológicos. Chamados graciosamente de ‘jardins’ ou ‘parques’ zoológicos, estes locais são destinados ao aprisionamento de animais selvagens, a maioria desconhecidos do público, para exibição e entretenimento do homem mediante o pagamento de ingressos. Seria esta uma visão radical? Tudo bem, temos outras definições mais pedagógicas e suaves. Para os defensores, o zoológico é um local de preservação e reprodução desses animais. E para a lei, pelo Artigo 1° da Lei Federal 7173/83, é considerado jardim zoológico qualquer coleção de animais silvestres mantidos vivos, em cativeiro ou em semiliberdade expostos à visitação pública.

Contra e a Favor

Os defensores dizem que os Jardins Zoológicos têm como ponto forte a conservação de espécies. Em outras palavras, ele serve como local de preservação de espécies ameaçadas de extinção pela destruição de seu habitat natural. No avanço científico atual, os pesquisadores têm até mesmo conseguido levar essas espécies à reprodução em cativeiro.

Além disso, outras razões são apresentadas na manutenção do modelo, tais como a possibilidade do desenvolvimento e aperfeiçoamento profissional (dos zoólogos, biólogos e outros técnicos e estudiosos do comportamento animal), a pesquisa científica da vida animal e, finalmente, a conscientização através da exposição com a clara ideia de difundir o pensamento de preservação da natureza selvagem.

Já os contrários ao modelo, insistem no argumento de que o melhor para os animais é deixa-los nas montanhas, vales, matas, cavernas, florestas, rios e mares - em seu ambiente natural. Ou seja, é uma insensatez retirar os animais de seu habitat e trancafiá-los em jaulas e espaços reduzidos ou, na melhor das hipóteses, em cercados de tamanho diminuto quando comparados com o espaço disponível de seu ambiente de origem (natural). O que devemos, argumentam, é proteger o habitat das espécies para que elas vivam ali da forma mais harmoniosa possível.

Um pouco de história

Desde o Egito dos faraós, cujos servos e soldados capturavam em suas caçadas gatos selvagens, macacos, babuínos e leões, e os mantinham (em seus templos) como símbolo de força e poder, até o século XVII, os zoológicos eram propriedades particulares e o seu valor era medido pelo grau de exotismo e ferocidade dos animais expostos.

No século XVIII nascerá o primeiro zoológico público, fundado em Paris (França) para abrigar animais oriundos de apreensões em circos e eventos que utilizavam animais em shows. Em Londres (1826) surgirá o primeiro zoológico público com o claro objetivo de ser uma instituição científica para o estudo dos animais. Justamente neste, com a finalidade de serem obtidos recursos financeiros para a manutenção dos animais, o local será aberto à visitação pública e, imaginem só, começaram a fazer shows com os animais para atrair os visitantes. Como aumentaram os visitantes, julgaram ser necessária a aquisição de outros animais – que foram buscados diretamente da natureza e colocados em cativeiro.


Desde os primeiros jardins zoológicos até por volta de 1900, os espaços, ambientes e jaulas eram construídos para proporcionar aos visitantes o melhor ângulo de visão, e não para dar boas condições de vida aos animais.


Em 1900 foi fundado na Alemanha o “Stellingen Zôo”, baseado em um conceito radicalmente diferente: os animais teriam recintos mais amplos e apropriados – estes espaços buscavam imitar o habitat natural dos animais. Embora positivo, nele foi continuada a ideia de manter aberta a visitação e de cobrar por ela. Este zoo na Alemanha foi fundado pelo naturalista Carl Hagenbeck.

Por que sou contra

O conceito e ideia dos melhores jardins zoológicos é a de cuidar dos animais que estavam sofrendo maus tratos em circos ou em ‘coleções’ particulares, ou ainda aqueles que foram vítimas do tráfico de animais.

Idealmente, estes animais (retirados de circos e do tráfico) deveriam ser reintroduzidos em seu habitat. Contudo, após anos em cativeiro, é fato que eles seriam presas fáceis ou morreriam por não saber caçar e se defender de seus predadores.

Entretanto, o contato com os seres humanos tem se revelado como uma das principais fontes de stress e enfermidades para várias espécies animais.

Em todo o século XX, vários pesquisadores se posicionaram pelo fim dos jardins zoológicos, marcando posição a favor da criação e aumento das reservas e áreas de proteção (ambiental) da vida animal nos países originários dessas espécies. Nestes locais seriam mantidas as pesquisas sobre os animais, com aparatos, equipamentos e cuidados para que houvesse o mínimo possível de invasão dos espaços da vida animal.

No distante 1937, Julia Allen Field afirmou: “Não podemos ver a beleza essencial de um animal enjaulado, apenas a sombra de sua beleza perdida.”

No final do século XX conforme tudo indicava, os jardins zoológicos estavam com data de validade vencida.

Grande engano, quase vinte anos se passaram e tudo continua como sempre.

Alguns equívocos, erros, falhas e ideias equivocadas continuam:
a) Várias espécies que não correm risco de extinção são mantidas cativas em jardins zoológicos, apenas para entreter visitantes.
b) Com a finalidade de aumentar o acervo, novas espécies exóticas são trazidas, num tráfico ‘autorizado e legal’, mas tremendamente danoso e eticamente questionável.
c) A insistência na reprodução em cativeiro de espécies não ameaçadas. Os filhotes nascidos nestas condições são ‘condenados’ a sempre viver em cativeiro.
d) Vários animais em condições de serem reintroduzidos em seu habitat, são mantidos em cativeiro. Salvo raríssimas exceções, não há uma política e ação séria de preparo dos animais para a reintrodução na natureza.
e) Os animais são tratados como propriedade do ‘homem’, obviamente contra a vontade deles.
f) A insistência no argumento do zoológico como um bom local de estudo das espécies. Desconsideram que o animal em cativeiro tem seu comportamento e hábitos alterados.
g) Os animais são ‘forçados’ a conviver com o homem, seu ‘tutor’.
h) Os animais são expostos numa exibição não consentida, pois na natureza várias espécies evitam ‘aparecer’ e se escondem naturalmente. É certo que esta exposição acarreta stress e outras consequências danosas aos animais.
i) Mantem os animais em um clima, vegetação e alimentação distintas de seu habitat natural.
j) Utilizam animais selvagens para entretenimento e lazer dos seres humanos.

Obviamente crescemos cercados e envolvidos pelo paradigma de que os jardins zoológicos são uma coisa boa, adequada e correta para com os animais.

Por este paradigma, é como se tivéssemos o ‘direito’ de capturar, prender e apresentar em exposição os animais selvagens. Ainda sob este prisma temos um bom argumento – nós os mantemos presos para o próprio benefício deles. Mas isso é equivocado. Segundo o cubano naturalizado brasileiro Pedro Ynterian, 71, presidente internacional do "Great Ape Project", que luta pelo bem-estar dos grandes primatas, zoológicos causam estresse aos animais, que chegam a se mutilar, e não têm importância pedagógica. “Crianças podem ver o leão no zoológico, mas o comportamento do animal é falso. Acho mais válido assistir a um documentário.”

Finalizando

Não consigo ver lógica e racionalidade nos argumentos apresentados em defesa dos zoológicos. Eles deveriam ser um lugar de transição com data marcada para fechamento – para que nos movêssemos em ações que levassem a ampliação ou criação de reservas naturais. O paradigma de que os jardins zoológicos são bons é tão forte que ‘cega’ e ‘ensurdece’ algumas pessoas.

Mas lentamente o movimento contra os zoológicos ganha adeptos. Enquete feita pela Folha Online com 5723 pessoas revelou que 46% (2.630 pessoas) são favoráveis ao fechamento dos zoológicos. Os demais, 54% (3.093 pessoas) são favoráveis à sua manutenção. Enfim, pela força dos movimentos e pelas pesquisas, podemos afirmar sobre o tema e sobre o futuro dos animais: 'a sorte está lançada' (alea jacta est).

Fonte:
SANDERS, Aline Sanders, FEIJÓ, Anamaria Gonçalves dos Santos.
Uma reflexão sobre animais selvagens cativos em zoológicos na sociedade atual. Disponível em
ALMEIDA, Flavya Mendes de. Bioética Aplicada a animais de zoológicos.
Disponível em: Historia dos zoológicos na Europa. Disponível em: BOSTOCK, Stephen St. C. Zoos and zoological parks. In: Encyclopédia of
Applied Ethics. Vol. 4. London: Academic Press, 1998. 571-582.
Zoológicos: Objetivos e conceitos. Disponível em: Folha Online. http://polls.folha.com.br/poll/1029903/results
http://mylostworldjm.blogspot.com/2011/05/nao-podemos-ver-beleza-essencial-de-um.html

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